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Boteco do JB

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Month: February 2020 (page 1 of 3)

enchendo lingüiça

a ideia é atualizar diariamente o blog até o fim do ano, pra depois revisar os textos e quem sabe transformar num livro, algo como um pretensioso diário de um cronista.

mas e quando se acorda sem sequer uma ideia de texto?

se publicitário engraçadinho fosse, colocaria aqui uma receita enchendo lingüiça e estaria feita a piada de tiozão. ainda bem que não sou esse cara.

aliás, houve um tempo em que frequentava no grajaú um boteco com esse nome, enchendo lingüiça, cujo carro chefe era um excepcional joelho de porco assado na tv de cachorro. sentava na praça, comia bem e ainda dava o osso pra algum tomba-lata esperto que ficava feliz da vida. já vivi melhor, de maneira mais contemplativa e a meta é voltar a esse estilo de vida.

curiosamente hoje em especial o pedaço onde moro está no clima oposto ao desejado, já que na república o carnaval ainda não acabou. ruas foram fechadas, vendedores de cervejas bosta estão a postos e logo os foliões amadores chegarão fazendo muito barulho ruim. e amanhã tem mais. saudades da época em que são paulo era só o túmulo do samba. agora virou uma espécie de cemitério maldito onde os walking zombies locais arrastam correntes de corote até a madrugada.

hoje também é aniversário de uma grande amiga que comemora a data apenas em anos bissextos como esse, mas estou meio ilhado aqui. difícil sair, horroroso voltar. nem o metrô funciona direito, o que é um absurdo completo. a atual prefeitura não facilita a vida em nada, só fode.

estou escrevendo um livro de receitas e passarei o dia na cozinha testando algumas delas, é o jeito. afinal, o ser humano funciona melhor sob pressão. e depois beberei bastante até cair de exaustão na cama que fica em frente ao balcão de bar do meu quarto.

e, antes que alguém me corrija, aqui a lingüiça sempre terá trema. bom enterro dos ossos a todos.

nem ele

se considerarmos que cometi meu primeiro negócio – uma banca de feira onde vendia frango e miúdos de boi – com apenas 13 anos, podemos dizer que tenho mais de 30 anos no ramo etílico gastronômico, atuando em vários segmentos. esse blog? diversão (ou tortura média) pra ti, trabalho (divertido) pra mim. aliás, sou craque em diversas atividades não remuneradas, taí uma especialidade.

mas só faço o que gosto, disso não abro mão. se não me identifico com a proposta oferecida, recuso a bagaça educadamente. acho que a quantidade de convites indecorosos recebidos quase toda semana renderiam um bem humorado livro. até sociedade de bar com picanha e cerveja gelada em piracicaba já me propuseram. e o número de gente que pensa em abrir comigo um bar especializado em negroni? admito que por algumas vezes é um tanto difícil não responder com ironia.

aí ocorreu que há duas semanas recebi um email – boa forma de aproximação, odeio receber direct em vias sociais por parte de quem nunca vi na vida pra escrever sobre negócios – de alguém no rio de janeiro. a carta eletrônica passava mais ou menos a seguinte mensagem:

Ô J! Sou do Rio de janeiro e quero saber quanto é sua consultoria completa, passagem inclusa. Abração do Marcelo!”

a primeira coisa que pensei foi: puxa, que bom que ele pagará passagem, né? valha-me! mas, sempre partindo da ideia da boa educação, o respondi:

olá, marcelo.

há alguns tipos de assessoria, algumas possibilidades. eu precisaria de mais detalhes para orçar o custo do trampo. por que não fazemos assim? combinamos uma data em que nossas agendas coincidam, você manda passagem aérea e hospedagem de duas noites em hotel médio em algum lugar razoável que não seja a barra da tijuca – que nem considero como rio de janeiro – e nos reunimos por um período de 2 a 4 horas, quando você poderá apresentar seu projeto e qual é a ideia de minha participação nele. se eu me identificar com o trabalho, te passo o orçamento completo em dois dias. claro que te respondo de qualquer forma.

muito obrigado pela lembrança e um abraço,

j.

você respondeu? nem ele.

um bom gelato

houve um tempo em que pegava meu saudoso fusca 68 e ia pelo menos 2 vezes por semana até o condado de moema para tomar sorvete do confeiteiro preferido. laranja com chocolate (não o sonolento oposto), manga, baunilha de madagascar e outros, uma festa. certa vez ele me confidenciou que existia um ainda melhor que o dele, de um louco francês que fazia as receitas todas no olho – o que é prova de insanidade – no pelourinho. claro que fui conferir e era isso mesmo e mais um pouco.

o amigo paulistano fechou o lodjinha e vai muito bem obrigado comandando uma escola de confeitaria. como salvador tá longe e o dinheiro anda curto, fiquei órfão de sorvete.

soluções paliativas foram tomadas. o casal de amigos que domina o pedaço onde moro abriu uma excelente sorveteria duas ruas pra cima de casa. soft ice cream. embora seja super bem feito e o de leite seja irrepreensível, não sou o maior entusiasta desse estilo, talvez até pela carência provocada pela falta dos dois citados no primeiro parágrafo. o problema sou eu, não o sorvete.

também abriu uma muito boa em pinheiros, com filial nos jardins. super cuidadosa tanto com a escolha dos ingredientes quanto com o padrão de excelência nas boas receitas. espero que achem ponto aqui pelo centro. hoje acho que é a que mais se aproxima ao que flavio fazia (em salvador preciso voltar o quanto antes pra ver se segue magnífico).

a meta sempre é que a boa comida faça parte do cotidiano, inclusive sorvete. então às vezes tento me enganar na recém-inaugurada unidade de uma famosa rede aberta no térreo do lindo edifício são luiz.

onde sobra açúcar falta sabor, ideal para paladares infantis, tudo dentro do script. mas não é todo dia que se merece o melhor, trata-se de um quebra galho. pena que é caro pelo que oferece. se fosse uns 30% mais em conta, seria belo concorrente pra indústria. e não adianta falar que não dá pra vender por menos, comigo tal argumento não cola. sei bem o tamanho do lucro que esse tipo de produto proporciona.

mas o que me incomoda mais nem é isso.

uma das cenas mais constrangedoras que o jeca cenário gastronômico nos oferece hoje é quando a pobre da atendente entrega o sorvete meia boca ao cliente e diz um bom gelato pra você. fico com tanta vergonha que inclino a cabeça pra baixo na hora, em sinal de solidariedade à principal vítima que no caso não sou eu. se coloque no lugar de qualquer membro da equipe e imagine passar o expediente inteiro desejando bom gelato para todos. é desesperador, puro creme da visão do inferno. tenho vontade de resgatar a equipe inteira e levar pra, sei lá, tomar um sorvete. ou uma cerveja pra esquecer esses dias duros.

saudades de salvador.

chuva de verão

já bem no começo da história desse famigerado blog explico porque ainda não fui no novo empreendimento daquele famoso chef francês televisivo. basicamente dou detalhes que giram em torno de não ter que ir num lugar onde nem o dono conhece direito, já que acabou de inaugurar. dar tempo ao tempo, deixar as pessoas trabalharem em paz.

há uma semana abriu aqui nos arredores simpático botequim com nome de miúdo de frango e ares tijucanos, dois pontos fracos meus. mas a regra do primeiro parágrafo vale para desde o investimento milionário até o mais simples botequim. se for ao negócio quando estiver mais redondo, a chance de perder é menor.

acontece que ontem uma chuva torrencial me pegou desprevenido bem na porta do minúsculo comércio que abrigou super bem eu e meu cachorro.

na falta de pelo menos uma cerveja que preste, generosa dose de cynar. desculpe, mário bortolotto! e depois um ou dois campari com gelo e laranja.

tinha acabado de almoçar e só por isso não comi absolutamente nada. mas a oferta de rango chamou a atenção com itens que remetem diretamente à minha memória afetiva de comida de boteco: fígado, jiló, moela, alheira, entre outras preciosidades. óbvio que voltarei com fome, ainda mais agora que já fui antes do tempo, foda-se. regra existe pra ser quebrada.

cozinheiro com cara boa e sócios trabalhando sem dó na operação, com raça. apesar de ter noite que fecham após as 2h, um deles me disse que pelo menos nos fins de semana querem abrir mais cedo. pessoalmente acho que o bar tem cara de dia, período inclusive que tem menos bebedor amador na rua.

só sei que num período de 30 minutos passei de não vou em lugar aberto em apenas uma semana a considerar pra caralho donos e fregueses, falei que levaria à espelunca meus amigos tijucanos, etc. até com uma pessoa fantasiada de pernalonga troquei rápidas impressões sobre o amigável balcão de fórmica vermelho. o que a chuva uniu só muita tosquice separará.

infelizmente os coxipsteys locais já descobriram o lugar, de maneira que é preciso muito cuidado pra escolher o horário da visita e não ser contagiado pela nova onda corona glitter. mas, como já disse, retorno e com fome, acho que vale o risco. quem sabe até não desenvolva relação afetiva com a espelunca? muito respeito pela comida de estufa.

boa sorte a todos os envolvidos.

anchovas

ainda tem mais um dia de carnavrau. a novidade no pedaço onde moro é que agora impedem até moradores de circular por certas ruas. ontem dei volta enorme pra ir à cafeteria e no retorno ainda me revistaram. detalhe. a revista não é feita em todas as pessoas, depende do estado de espírito de quem ta na função e também da aparência do pedestre. não preciso dizer que é óbvio que revistas muito mais severas são realizadas.

manter esse blog atualizado diariamente faz com que às vezes saia mais que gostaria, mas nessa época do ano não tem negócio. café, mercadinho e olhe lá. no horário certo, porque o toque de recolher rola por volta das 16h. a partir daí as ruas se transformam num bizarra espécie de corotelândia.

mas aproveitei os dias pra dar boa adiantada no novo livro que, se tudo der certo, sai ainda nesse ano. terá receitas e crônicas em homenagem à imensa nina horta.

como sou desfocado, também preparei algo que não entrará no livro. espaguete com tomate, cheiro-verde, amêndoas tostadas, copa lombo e deliciosas anchovas cantábricas impossíveis de achar aqui por essas bandas tropicais. ficou bom, bem bom.

a santíssima trindade escrever/preparar drinks/cozinhar funciona como uma sagrada terapia que segura a onda do meu previsível cotidiano.

amanhã é quarta-feira de cinzas e já dá pra dar um rolê. devo almoçar na casa de shows para a qual presto assessoria etílica gastronômica, pegar uma encomenda na atual livraria preferida e jantar com um colega num ótimo restaurante japonês. as coisas voltarão ao normal.

já hoje tentarei caçar assunto pra postar aqui amanhã cedo, mas estou enclausurado e pouco otimista.

bom fim de carnavrau, camaradas. se cuidem.

futebol arte

comer menos, comer melhor. o mesmo com bebida. depois de certa idade, soa um tanto óbvio.

comer é um ato político. sim, de acordo. minha parte tento fazer, divulgando trampos legais e denunciando outros menos nobres, desde que comecei a publicar sobre gastronomia.

o problema é quando a palestra se torna maior que a causa. o mundo tá muito cheio de opinião que ninguém quer saber.

mentes preciosas tem dado mais atenção à bandeiras que aos seus próprios trampos e isso joga contra pra caralho. não se deve menosprezar o que se faz bem.

quando um artista abandona sua arte para apenas discursar o resultado final é que ele é cancelado pela maioria da população, funciona contra.

não podemos esquecer quem somos e o porque de termos um público. não deixemos que nos manipulem.

político eleito é o funcionário público a ser combatido, independente de seu partido político. escolha bem seus inimigos. brigue contra eles, não entre vocês.

quanto maior o alcance, maior também é a responsabilidade. se conquistou seu público cantando, dê a eles o que querem, cante. e, ao fazer uma declaração política, seja pontual e econômica. a chance de te ouvirem é maior, garanto. e por aí vai, em todas áreas.

o ano passado, por exemplo, trabalhei por bom tempo num armazém ligado ao mst. comida saudável, agricultura familiar, pacote completo. uma das maiores dificuldades foi a de apresentar produtos de maneira simpática e coerente. eu não quero comer uma empanada vegana, mas uma esfiha de escarola com alho, tomate e castanhas tostadas, sim. quem é vegano vai entender e quem não é talvez se interesse. a causa deve ser consequência de comida gostosa, não o contrário. esse trampo acabou, umas coisas deram certo e outras não. mas espero ter plantado alguma semente.

porque existe todo um mundo além da bem intencionada bela gil. há duas semanas a encontrei num evento gastronômico e provei algo dela, que me perguntou toda sorridente se estava bom. sem graça, fui educado e desconversei, mas a real é que tava mais asséptico que chuchu sem sal. no lugar dela, cozinharia em hospital. sério, palavra de quem já foi internado por algumas vezes. a rotina hospitalar é um tanto chata e tentar achar algum sabor na comida da artista em questão pode ser tarefa divertida. mas ali tá tudo certo, ela oferece o que tem, o que consegue fazer.

no fundo, no fundo sabemos que a derrota é inevitável. mas não deixe que a militância apague sua voz. uma coisa está ligada a outra e é impossível a sobrevivência de apenas uma delas. equilíbrio que chama.

não sejamos cães raivosos. porque é melhor perder como em 82 que ganhar em 94.

a peste

sempre considerei a ressaca um sintoma de amadorismo, coisa de quem não se conhece direito. e tudo bem. não é possível agir de maneira profissional todas as noites.

toda vez que, como hoje, acordo com dengue, recapitulo o ocorrido nas últimas horas, pra lembrar das merdas que fiz. pra mim, quase sempre é a mesma coisa. exagero. a enorme resistência pro álcool que tenho por vezes me faz agir como se fosse superman. mas não sou.

o que poucos irão te falar é que a receita para evitar ressaca não é como receita de bolo. as pessoas são diferentes das outras, cada um tem seu limite. mas posso falar o que faço. e mesmo assim às vezes falha. raramente, é verdade, mas pode acontecer.

a primeira coisa é beber água pra caralho durante o dia inteiro, água a rodo, água pra porra. inclusive enquanto se bebe os goró, alternadamente.

a outra é se alimentar de maneira adequada. eu não gosto de beber de dia, sou boêmio, turno da noite. o que significa que almoçarei bem e tarde. saco vazio não para em pé. já durante o porre, no máximo tira gostos, tais como torresmo e rollmops. comer depois é um erro redundante, porque pinga também alimenta. não se comporte como um adolescente.

pode misturar álcool, sim. desde que um seja a estrela da noite. uma ou duas doses de cachaça numa noite regada a chopp não vão me matar e por aí vai.

e durante o jantar? pode beber? eu bebo, mas menos. questão de limitação física, ainda não existe a tão sonhada operação bariátrica onde se implanta um estômago a mais, pra comer e beber o quanto desejo.

mesmo tomando todos cuidados, à vezes dá ruim. mas estamos no meio do carnaval. no pico onde moro pego o cruzamento de som de dois blocos grandes e um médio, fora o barulho da rua, que dura a madrugada inteira. não consigo ler um livro, nem ver um filme. mas um bar no quarto eu tenho, assim como bons vinis e belo aparelho de som. chutei o balde e bebi de maneira desenfreada sem perturbar ninguém. se hoje estou doente, ontem fiz a peste valer a pena.

algumas coisas podem foder teu fígado, eu peco pelo excesso de comida e bebida boa. procuro honrar meu estado físico, escolha consciente.

tem mais dois dias de carnaval pela frente e ainda o pós da semana seguinte. a despensa e o bar estão abastecidos, tudo foi providenciado. espero que todos se divirtam, cada um a sua maneira.

a água já tá na mão e provavelmente farei um carbonara agora, clássico cura ressaca aqui de casa. à noite pretendo beber com mais cuidado e amanhã não tem dengue, bebê.

boa ressaca, camaradas.

não se encapsule

acordar, dar comida pro cachorro, passar um café e vir pra frente do computador atualizar esse diário, na maioria das vezes sem assunto predeterminado. essa tem sido minha rotina matinal.

o exercício da caça do assunto do dia é difícil, mas o café sempre é de boa qualidade e moído na hora. geralmente tenho dois ou três tipos à disposição. o de hoje foi selecionado pela juliana ganan, comandante da tocaya, grande torrefadora brasileira.

também frequento cafeterias e bebo café em restaurantes que se importam com a bebida. a minha cobrança com a qualidade do produto varia de acordo com a proposta do comércio. não espero, por exemplo, beber num restaurante médio algo tão bom quanto num lugar especializado nesse tipo de serviço.

o que não significa que tenho tolerância pra café de cápsula. quando esse lixo entrou em cena o mercado era outro, inclusive em termos tecnológicos. não existia, por exemplo, boa máquina automática à disposição. então em vez de investir num profissional + maquinário grande e complexo optavam pela cápsula, que pelo menos saía sempre igual. dependendo do tipo de operação, isso era compreensível, apesar do péssimo gosto.

mas hoje temos máquinas automáticas que ocupam ainda menos espaço que as odiáveis navinhas espaciais cuspidoras de cápsulas bosta.

também é mais barato trabalhar com bom café vindo de agricultura familiar. servir produto decente dá mais lucro, isso se você não aceitar patrocínio dessas empresas filhas da puta. tem curiosidade em saber de onde vem tanta verba? pois siga o caminho do dinheiro e se enoje.

ou seja, hoje não existe motivo algum que justifique servir café de cápsula nem no posto de gasolina, quanto mais num restaurante com pretensão dita gastronômica. espaço, logística, lucro, nada. não se ganha nada, a não ser que tenha algum interesse escuso envolvido.

sem contar que café espresso nem sempre é a melhor opção. felizmente o que não falta na atualidade é lugar que oferece excelentes opções de café coado, inclusive armazenado em garrafas térmicas manêras. o tempo derruba preconceitos um a um.

não compactue com quem não se importa com você e ganha rios de dinheiro em cima de atividades suspeitas que resultam num produto lixo.

diga não ao café de cápsula.

jerez martini

nascido no rio grande do sul, ele é jovem, talentoso e esperto. profissional do ramo etílico, quando o conheci, trabalhava na unidade paulistana de uma grande importadora de vinhos catarinense.

após encerrar seu ciclo na loja, foi pra londres passar boa temporada trampando num belo bar de vinhos. sempre dentro do seu segmento. foco.

de volta ao brasil, conheci o projeto do seu bar ainda no papel e me chamou a atenção pelo alto nível da parada. remetia aos ótimos bares de vinho que fui em londres. fiquei ansioso por sua inauguração.

até a escolha do ponto foi acertada e o bar ficou lindão, apesar do aparente pouco dinheiro usado. situação financeira que, nesse caso, ajudou. é bom quando a água bate na bunda. e verba parca evita que se gaste com alegorias e adereços que nem sempre são de bom gosto, situação que chamaremos nesse parágrafo de efeito tuju.

como de costume, aceitei o convite para a inauguração. e furei, claro. sou averso a esse tipo de evento com um monte de gente folgada alucinada por boca livre. além do mais, é preciso dar tempo pro dono do comércio se encontrar, saber onde estão as coisas, etc. inaugurar nunca é fácil.

acontece que o bar é meu vizinho e uma visita de boas vindas está no script, ainda mais num projeto pelo qual me identifiquei tanto. então não deixei completar nem um mês de funcionamento e fui.

bom dono de bar é aquele que sabe o que o freguês quer beber e ao me ver o colega já veio com uma taça de jerez fino pra mim. começamos bem. nessa noite ainda bebi ótimo riesling e comi um pan tomaca delicioso. o espaço ficou exatamente como imaginei. lindo, com apenas uma mesa coletiva e sóbrio balcão com bancos confortáveis. mas me chamou a atenção como já abriu bombando e também a quantidade de faria limers bebendo gim tônica e longui nétis num bar de vinhos. talvez colocar cocktail e cerveja não tenha sido a decisão mais acertada.

porém entendo a atitude, pois ele tem bom senso de noção de coquetelaria. o jerez martini servido por lá já se tornou um dos bons drinks da cidade e a tônica marsala alivia um bocado as noites cada vez mais secas que tem feito. mas que não precisava da longui néti, não precisava. um desperdício, tinha tudo pra ser um bar de vinhos tão incrível…

a real é que por mais que se estude, que se faça consistente plano de negócio, só se conhece a demanda do comércio quando finalmente se abre as portas. e por muitas vezes o resultado é surpreendente, já vi esse tipo de situação constrangedora ocorrer por inúmeras vezes.

na medida do possível em que a muvuca não me desanimar, a driblarei e seguirei frequentando a pocilga. estarei lá no canto do balcão, com um jerez fino na mão e de costas pros manos armados com bebidas de casamento. é preciso saber usar o que o bar tem para lhe oferecer.

mas que podia tirar a longui néti, podia.

áudio

infância, anos 80. quando engatava a terceira marcha rumo à falação desenfreada minha mãe me lembrava que existe uma razão lógica para o fato de eu ter dois ouvidos e uma boca. aprendi a ficar mais de boa.

quietude.

novo milênio, velhos hábitos. quando começo a publicar sobre gastronomia, os aparelhos telefônicos móveis ainda não tinham se tornado patrões das pessoas, mas já se apresentavam em suas mãos sem a menor timidez. a necessidade das pessoas de se expressar é que eliminou sua capacidade de contemplar. situação que vai contra o texto, pois se eu ficar no balcão do bar atualizando mídias sociais, é mais difícil caçar assunto pra escrever sobre o que talvez interesse de verdade. sem contar que a comida esfria, o drink esquenta, etc. incrível como a qualidade de vida pode ir pro saco assim por coisas simples e ninguém dá a mínima.

e a coisa só piora. já faz alguns anos que a principal mídia social funciona em torno de uma foto ruim com uma legenda qualquer. minimalismo no sentido mais tosco possível. por isso voltei a blogar. textos novos todo dia, sem retrato, sem selfie, tal como um exercício literário. o resultado nem sempre é o esperado, mas a terapia é ótima. e, se conseguir fazer com que meia dúzia de pessoas parem seu dia pra ler um texto médio, já valeu a pena. admito que tem sido difícil achar tema pra atualizar o diário com a frequência comprometida, mas ainda estou aqui.

vivão e sem mandar mensagens de áudio, a nova praga imposta por essa tecnologia nefasta que robotiza as pessoa tudo.

nada mais narcisista que mandar tal mensagem. porque você não a manda para o outro, mas para você. já que não é capaz de ouvir o próximo, então ouça a si mesmo, assim que funciona na prática.

e ainda tem a inutilidade da bagaça. uma mensagem de áudio nunca tem razão de existir. recados rápidos, tais como tô chegando podem ser escritos ou apenas não comunicados, de tão rasos que são. já as longas podem ser realizadas de maneira escrita, se não for possível um encontro físico. assim existe comunicação. o áudio anula o diálogo.

a tecnologia está aí para te servir, não o oposto. não seja escravo dela.

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